sexta-feira, 29 de julho de 2011

Da Série Verdades Indissolúveis: a injustiça do mundo

Tá, o mundo é injusto.

(eu sei, você sabe, o Tiririca não sabe, mas também, não se pode saber tudo de tudo - aplausos pr'ele!)

Ok, vou mudar de assunto.

...

(mas a injustiça do mundo me deixa com sangue nozóio e fogo nas ventas: se não escrevo sobre isso, agora, juro, estouro!)

Então chega aqui pertinho e grita comigo: Ô MUNDINHO INJUSTO!

Porque eu sou da turma que teima em acreditar "que tudo não terás!"

Assim, se a tipa é magra, linda, lôyra, ryca e francesa, ao menos tem que ter algum defeito. A mãe olha embevecida pra bebezinha que acaba de nascer: esbelta, pernas longas, sem dobrinhas nem celulite (que ela confere apertando a bundinha, claro). "Olha!" exclama, "até os pentelhinhos dela são loiros e naturais"! O gugu dadá todo trabalhado no sotaque francês. "Cosiquita mais fôufa ela fazendo biquinho, corre vem ver, traz a filmadora"... Mas daí vem a tia (ou a sogra) e repara que - suprema presença divina na terra! - a menina tem pé grande.

Percebe que o equilíbrio deste planeta é coisa muito sutil? Muito além do que nossa vã ecologia poderia supor...

Gisele Bündchen, por exemplo. Dizem até que pariu sem dor. Pois eu lhe digo: tem mau hálito! Como sei? Foi um passarinho que me contou... o passarinho verde e desplumado da inveja!

E foi esse mesmo passarinho que baixou aqui hoje, enquanto eu compensava a balança da justiça do mundo lavando os pratos com as mesmas mãos abençoadas que acabaram de preparar mais uma refeição divina (percebeu como funciona o equilíbrio natural dos elementos cósmicos? Quem seduz com seus dotes culinários NÃO terá o direito de ter uma ajudante na cozinha!).

Passarinho chegou, como quem não quer nada, cantarolando uma musiquinha delícia tirada de um comercial da TV e me conta sem piedade que a dona da voz rouca e sexy da canção é a Scarlett Johansson! 

Cabô comigo... Scarlett Johansson sabe cantar? E tem essa voz?


Ô   M U N D I N H O   I N J U S T O !



*




* o comercial que tem Relator como trilha é este . E descubro, aliviada, que Scarlett tem celulite. Fiquei lisonjeada agora: não é que temos uma caracteristica física em comum?

O que o polvo Paul verdadeiramente disse


  • eles são conhecidos como holdouts
  • militares japoneses que, sem informações oficiais sobre o término da segunda guerra mundial, continuaram lutando e resistindo em seus postos em algumas ilhas do Pacífico
  • isolados e com comunicação precária (geralmente dependendo de algum bravo mensageiro voluntário ou bilhetes amarrados em vacas ou folhetos jogados por aviões)
  • os holdouts eram instruídos a: 1 - resistir a qualquer tentativa de ocupação, 2 - não se render e 3 - não se matar, sob qualquer circunstância
  • ou seja, não cediam nunca!
  • qualquer tentativa de contato era interpretada como armadilha ou, na melhor das hipóteses, propaganda do inimigo
...
  • o caso mais famoso é de Hiiro Onoda
  • Onoda ficou 30 anos isolado e mandando chumbo em quem se aproximasse
  • feriu 100. matou 30.
  • transformou-se em uma espécie de ermitão assassino, odiado pelos habitantes locais
  • não acreditou nem na voz de seu superior, reproduzida em carros de som
  • até a mãe dele foi até ele; gritou com um megafone (!), sem sucesso.
  • paranóia total.
...
  • mas a história fica ainda mais surpreendente.
  • em 1974, um estudante japonês chamado Nario Suzuki resolve sair com sua mochila mundo afora
  • na cabeça, três objetivos: "achar Onoda, um panda e o abominável Homem das Neves"
  • como só se vê em Hollywood, Suzuki vai até a ilha nas Filipinas, esquece as praias paradisíacas, entra pela mata e dá mesmo de cara com Onoda
  • grita 3 vezes "sou japonês, sou japonês, sou japonês" e ...
  • não é alvejado!
  • após quase 8 horas de explicações (onde imagino o soldado reaprendendo a conversar) o estudante conta-lhe tudo o que aconteceu
  • ainda assim, Onoda recusa-se a abandonar seu posto - "não sem a ordem de meu superior"
  • o estudante volta para o Japão e localiza o superior de Onoda,
  • um tal de Major Taniguchi, que à essa altura está aposentado e virou dono de livraria.
Taniguchi e Onoda

  • em 1975 (29 anos após o término da Segunda Grande Guerra Mundial),  Onoda finalmente se apresenta diante de seu superior, impecavelmente uniformizado
  • este é o trecho de sua autobiografia onde relata este momento:

"Nós realmente perdemos a guerra! Como fomos tão desleixados? De repente tudo ficou escuro. A tempestade rugia dentro de mim. Eu me senti como um idiota por ter estado tão tenso e cauteloso no caminho para cá. Pior do que isso, o que eu tinha feito durante todos esses anos? Gradualmente, a tempestade amainou e pela primeira vez eu realmente entendi: minha vida, os trinta anos como guerrilheiro para o exército japonês, tudo acabado. Este foi o fim. Puxei o ferrolho no meu rifle e descarreguei as balas... Baixei a sacola que sempre carregava comigo e depositei a arma em cima dela. Será que realmente não terei mais uso para este rifle que eu tinha polido e cuidado como a um bebê todos estes anos? E o rifle Kozuka, escondido por mim em uma fenda nas rochas? A guerra realmente acabou há 30 anos atrás? Se isso for verdade, não teria sido melhor se eu tivesse morrido?"
...
  • Onoda ainda teve que ser perdoado por seus crimes por Ferdinando Marcos, então presidente das Filipinas, para tornar-se um homem livre 
  • e foi só em 1979 que voltou ao lar
  • [pensou que este era o fim da história? então senta!]
  • Onoda deu uma guinada - hemisferial - em sua vida
  • infeliz com as modernidades do Japão saiu de mala e cuia para...
  • adivinhe?
  • o Brasil! foi parar no Mato Grosso do Sul
  • aqui criou gado; casou-se.
  • e mesmo com a vida tranquila no interior rico e fertil do país 
  • mais uma vez dá uma reviravolta em sua vida:
  • em 84 volta para o Japão e inaugura uma escola especial de técnicas de sobrevivência
  • seu objetivo? "aumentar a independência e autonomia dos jovens cidadãos japoneses".
  • Onoda ainda vive; em 2012 fará 90 anos
  • [o que significa que a história ainda pode aumentar; portanto, Sem Fim]
...
  • pena não ter conseguido descobrir se o estudante Suzuki encontrou um panda
  • [que Onoda é tão mais absurdo que o Abominável Homem das Neves que nem vale a busca]


*




* esta história incrível me faz lembrar de uma piada de humor negro e de uma entrevista que li, ano passado, em uma revista espanhola. O entrevistado, o jornalista que é o âncora do telejornal de maior ibope na Espanha [desculpe minha memória fajutinha, mas não gravei o nome], em um trecho conta o que ainda o fascina na profissão - "as histórias de vida, a própria vida, o fantástico em tudo. Veja a Copa de Futebol deste ano [2010]. Se alguém viesse me procurar há dois meses contando de um polvo inglês em um aquário alemão que prevê - com acerto! - os resultados finais dos jogos do futebol, eu não só duvidaria, mas desconfiaria que meu interlocutor estivesse em uma viagem de ácido". Então ficamos assim: sempre que você se sentir desacreditado da vida e tudo lhe parecer sem graça, lembre-se do polvo Paul. E de Hiiro Onoda! ** mais um post gentilmente patrocinado pelo Wagner Brenner, do update or die. ***  a piada, de tão incorreta, conto só sob tortura!

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Tanta maravilha...


maravilharia durar

aqui neste lugar

onde nada dura

onde nada pára

para ser ventura


Paulo Leminski, in Caprichos & Relaxos, 1983



*




* na foto [que não é montagem], o lago Luguhu, onde vive o povo Mosuo, também conhecido como "o reino das mulheres na China". Em um país notadamente machista, entre os mosuo são as mulheres que tomam todas as decisões, inclusive na hora do amor. Se elas não gostam de um homem, dizem "não". Cantando (isso: dizem não cantando!). Mas se elas gostam do parceiro, simplesmente deixam a porta aberta para o homem entrar. As mulheres mosuo podem viver sozinhas a partir dos 13 anos. Aos 17, lhes é permitido abrir a porta de casa para o homem que quiserem. A vida sexual das mosuo é muito ativa, trocam de parceiro com frequência e são elas que decidem com quem querem passar a noite; mas na hora da sedução deixam os homens acreditarem que são eles que escolhem e fazem a conquista. Não existe monogamia entre os mosuo. Mas existe fidelidade: quando uma mulher se apaixona, só permite que seu homem visite sua cabana (explico: à entrada de cada cabana há um gancho; quando um homem visita uma mulher, pendura o chapéu à frente da cabana, sinalizando que naquela noite está acompanhada). O conceito de paternidade e o termo "pai" não existem no dialeto mosuo, mas muitas crianças conhecem o seu progenitor e visitam-no ocasionalmente. No dialeto deles também são desconhecidas as palavras [e o conceito de] "guerra", "homicídio", "violação" ou "prisão". São as mulheres que administram todo o dinheiro da família. Cuidam de tudo, do trabalho pesado à arrumação da mesa farta [que nem precisa ser mosuo para uma mulher intuir da importância da beleza e da boa comida no dia a dia]. E as mulheres mosuo são lindas! Pra quem não acredita em paraíso na terra, o lago Luguhu e os mosuo podem forçar a revisão de alguns conceitos... Eu, por exemplo, chego a conclusão de que os homens deveriam voltar a usar chapéus...

O melhor presente que já ganhei dos meus pais

27/07 não é o dia do meu aniversário.
Mas é como se fosse.
Se o melhor presente que os pais podem dar a seus filhos é um irmão, hoje é dia de abraçar meu presente a agradecer por sua existência.

Um irmão é escola, ensaio e prática de vida. É ter a oportunidade de errar, testar o limite do outro, aprender e confiar. Que mesmo após aquela briga de "nem sei porque você nasceu?" ainda existem muitas risadas e cumplicidade pra se trocar.

  • e existe sensação mais reconfortante, mais acolhedora que a cumplicidade dividida entre irmãos?
  • Perceber que mesmo olhando em direções opostas, gostamos muito de estarmos juntos!
*


  • Para ti, Marcelo, com quem divido os melhores momentos (e as melhores fotos), uma lembrança feliz, direto do fundo do báu dos tempos: The Monkees!

Feliz aniversário, meu irmão!


*



* na foto, de 1971, eu e meu irmão Marcelo; eu com 3, ele antes de completar um ano. Gosto de ver que é meu braço que o apóia ereto. Divirto-me com as meias 3/4 que ambos usamos. Mas, de tudo, o melhor é o sorriso. Adoro!

terça-feira, 26 de julho de 2011

Noites meus dias são




Meu olho vê melhor quando fechado está;
Olha do dia à luz coisas que não se cuida,
Mas se sobre ti pousa em sonho, quando durmo
Obscurantemente, em sombra escura aclara-se.
Tu, cuja sombra dá às sombras claridade.

Que supremo prazer para o olhar se te visse
De dia, quando vens, bela sombra imperfeita
E te deténs em meus olhos sem vista!
Noites meus dias são, enquanto não te vejo,
E se contigo sonho, noites são claros dias!


Shakeaspeare, Soneto 43


*



* Melody Gardot me conquistou com sua voz jazzy, o ritmo suculento como se madura fosse, mesmo tendo só vinte e poucos [e descoberto a música aos 19, após ter sofrido um acidente que lhe tirou a visão]. Há dias que são mesmo uma noite... Mas é da noite o reino dos sonhos!

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Feeling this way today



"Quando você faz vinte anos anos está de manhã olhando o sol do meio dia. Aos sessenta são seis e meia da tarde e você olha a boca da noite. Mas a noite também tem seus direitos. Esses sessenta anos valeram a pena. Investi na amizade, no capital erótico, e não me arrependo. A salvação está em você se dar, se aplicar aos outros. É preciso vencer esse encaramujamento narcísico, essa tendência à uteração, ao suicídio. Ser curioso. Você só se conhece conhecendo o mundo. Somos um fio nesse imenso tapete cósmico. Mas haja saco!"


Hélio Pellegrino, em carta a Fernando Sabino


*


* porque hoje senti medo de sair da casca. Vontade de me enrodilhar e ficar só vendo o mundo passar. O saco é que a casca pesa! Hélio, desça já daí e me chacoalha que só sua sabedoria não está sendo suficiente...

domingo, 24 de julho de 2011

O normal e o extraordinário

O normal (um pouco além, mas, vá lá):


e o extraordinário:



*



  • para tudo o que é normal e extraordinário sempre haverá o ovo.
  • OvO é o elo! 

*



* porque posts nonsense tem lugar cativo no coração dos leitores deste blog ** para a pessoa mais extarordinariamente cativante da face da terra. *** e o verão, hein... quando? quando?

A música te conhece


A música, de certa forma, nos diz o que fazer.
É uma forma tão mágica de expressão que a gente até fica um pouco atordoada com tanta clareza. A letra fala uma coisa, a melodia reafirma incisivamente e, em questão de minutos, caimos completamente na conversa das duas.
A música nos conhece. Ela sabe do que você precisamos e do quanto precisamos. Então fica ali, no cantinho, sussurrando as coisas que evitamos pensar, achando que faz isso pelo nosso bem. E se não damos ouvidos de primeira, ela não tem dó: vai lá e cutuca até que seja impossível ignorar o incômodo. E aí vem aquele transbordamento desnecessário de pensamentos, emoções e, sei lá, patinhos de borracha mentais que ansiamos nos livrar. A música resume tudo o que guardamos e, em vão, tentamos esconder de nós mesmos.
Durante aqueles três, quatro, dez minutos, nossas vidas ganha um prisma novo. Tornamo-nos conscientes da loucura. E é quase inevitável: entre um e outro verso, chegamos a uma decisão bombástica.
Sim, tomaremos a iniciativa. Avançaremos os gigantes centímetros que faltam. Pegaremos o primeiro trem e hasta la vista! Pra onde? Não importa. A música não consulta mapas nem tem gps acoplado. Só diz: foge, corre, agora!
E se aqueles três (quatro, dez) minutos se arrastassem pela eternidade, nós bem que iríamos... são tantos os que vão. Mas o chão está tão sólido e é tão difícil e a vida não tem essa trilha sonora tão encorajadora e se pudéssemos ao menos ter a garantia de que ela sempre vai nos acompanhar e dar essa segurança que sentimos no momento e...
Acabou. Tão bruscamente como começou. As vitórias, as revoluções, as mudanças vão ficar ao sabor da próxima canção na playlist da nossa vida. Ou do botão repeat.
Deve ser por isso que a gente dança. É um conforto não ficar parado quando tudo o que se quer é simplesmente movimento.


*



* um tributo à Amy W. ** o textito não é meu, tá, sinto muito. acho que é da Cláu. vou perguntar e depois conto...

Cortina de fumaça

Jean Reno [avant, le chat]


Baryshnikov e Liza Minelli


Ava Gardner [e as Torres Gêmeas]


Anita Ekberg


Bob Dylan

Marilyn Monroe


Salvador Dalí e Gabrielle Coco Chanel


Lennon [enquanto os outros Beatles tomam chá]


 Sophia Loren e Marcelo Mastroianni, em cena


The "rat pack" - Dean Martin, Sammy Davis Jr. e Frank Sinatra 


Simone de Beauvoir, Sartre e Che. Conta a lenda que um dia perguntaram à Sartre: O que há de mais significativo em sua vida. "Tudo", Sartre respondeu. "Amar. Viver. Fumar".


James Dean


Peter O'Toole


Paul Newman


Marc Jacobs


Os arquitetos Charles Eames e Eero Saarinen


Diana Vreeland


*


Acendo um cigarro [...]
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

Fernando Pessoa [Álvaro de Campos] Tabacaria, 1928

*




*



* não fumo. jamais fumei. mas ando pensando que deve ser uma libertação expirar algo mais visível que apenas ar. deixar sair. exaurir o peito e ver tudo se transformar em fumaça.. ** música do filme Smoke, de 1995, composta por Jerry Garcia, do Grateful Dead. 

Wanderlust



  • wanderlust é daquelas palavrinhas lindas com muitos significados e que só existem para justificar a existência de tantas línguas mundo afora
  • e que não deixam margem para traduções simplistas do lado de cá.
  • assim como a palavra saudade na língua portuguesa,
  • wanderlust não prevê uma completa tradução em português - ou em outra língua, fora do alemão.
  • se o mundo fosse reto, diria que significa "desejo de viajar"
  • mas é redondo. e os alemães não facilitariam assim as coisas pra gente. ah, não eles...

  • wanderlust também quer dar conta do implacável desejo de ir, apenas ir, a qualquer lugar
  • que tanto pode ser um destino previamente conhecido, como também àqueles onde não sabemos bem onde vai dar
  • sabe aquela sensação de nostalgia de um lugar no qual você nunca esteve antes? Wanderlust!
  • e a busca do santo Graal? Wanderlust!
  • a procura da Arca Perdida, da Pedra Filosofal, da cura do Câncer, do guru na montanha mais alta do Tibete: wanderlust!
  • seja em uma jornada de autoconhecimento, de resgate do passado, de busca filosófica ou de encontro do divino, wanderlust te levará.

afinal, "para viajar basta existir" (diga-me cá, Fernando, como pôdes tanto sendo só um Pessoa?)


...


  • mas cuida, que wanderlust também dá nome à dolorosa sensação que domina corpo e a mente assim como um desconforto nas pernas e nos músculos caso a viagem não tomar início
  • (angústia, ansiedade, torpor, desencanto?)
  • e eu que andava me contorcendo entre tantas sensações inexplicáveis encontrei em wanderlust a exata medida de tudo o que sinto e preciso neste momento
  • não é assim? que costuma acontecer?
  • muitas vezes tudo o que se necessita,
  • é só uma palavra...
  • e agora que a encontrei, nada mais importa
  • confio.
  • preparo-me para a jornada
  • que é, sem dúvida, muito mais importante que o destino.

*



*  tanta tinta, quando só o filme para a Louis Vuitton bastaria.... aqui, uma versão alongada dele, com mais imagens de tirar o fôlego (mas sem o texto, pena! mais alguém com fetiche por palavras?)

terça-feira, 19 de julho de 2011

Da série Verdades Indissolúveis: Sansão





*








* Regina Spektor [ou Регина Спектор, no alfabeto cirílico], coincidentemente, está sempre às voltas por aqui. Me enrosco na sua voz, seu sotaque russo, suas letras de música. Hoje, foram os cabelos de Sansão que me deixaram à deriva: "... sob as folhas de papel jaz minha verdade."

Olhar


Em the Last Sitting, o livro onde estão muitas das melhores fotos de Marilyn Monroe poucos dias antes de morrer, Bert Stern, o fotógrafo, conta como foi a sessão [e a certa altura diz]:

"Eis que estou em cima dela. Mas não ultrapasso a última etapa, onde a vista se confunde com o tocar. Ainda não. Se fizer isso agora, tudo terminará muito cedo e a energia que alimenta estas imagens irá evaporar-se. Em vez de me inclinar sobre ela como desejo, fico ao seu lado a uma distância magnética que é um pouco o contrário de tocar. Quero ter tempo para olhá-la antes de precipitar tudo. Essa energia do olhar é maravilhosa."



  • e não é que Bert acaba de nos mostrar como um momento é suficiente para estabelecer a magia entre dois seres?
  • quando estamos a milímetros do inevitável e esperamos por ele só mais um instante até...
  • não conseguirmos aguentar mais!
  • [porque a seguir virão as tempestades de inverno...]



  *


 
* porque estamos no inverno e passei o domingo em frente ao mar, olhando as ondas tecerem lençois de renda na espuma. Porque sempre gostei de observar os banhistas que não se intimidam com a água fria e nem com os ventos que varrem a praia, em julho. Porque tudo sempre se resume ao olhar.  ** com este, vou completando a série Dos Sentidos. A ver: Fome, Febre e Perfume de gente  (e ainda devendo o texto sobre a a audição. Aguarde!)

Por uma vida mais picante


Ode às Picâncias por Hugo Delgado*


"Meu señor, minha señora, señorita, que medo é esse contra o chilito? Na minha terra usamos "chilito" quando falamos com carinho, sentimento que sinto em abundância por este fruto do continente americano que se espalhou pelo mundo pelas barcas espanholas e portuguesas: a pimenta!

Sou apaixonado pela pimenta que me perfuma os momentos, me incita travessuras, me pica a curiosidade, que me arde os lábios e me queima a língua, que me adormece as extremidades, hipnotiza meus pensares, me da água na boca, acelera meus pulmões, me excita as paixões e me erotiza as intenções. Como alguém poderia voluntariamente se privar de um alimento com tantos benefícios comprovados?

Hoje o chile é personagem central nas culinárias de muitos países e quase a metade da humanidade se rende aos encantos deste elixir. Coloque um pouco do mexicano chipotle nos ovos mexidos do café da manhã e o dia fica ensolarado. Para se refrescar numa acalorada tarde em Belém do Pará a tradição manda um escaldante tacacá com sua pimenta-de-cheiro amazônica. E basta sentir nos lábios os efeitos do pequeno - mas picante - olho de pássaro de um explosivo curry thai para se sentir a verdadeira Angelina Jolie.

A pimenta é um prazer que deve ser encarado sem pudor! Para os temerosos, sugiro receitas tolerantes. E para os valentes, os pratos que separam os machos dos macho-menos, como diria a minha mãe. Que tal? Vamos cozinhar juntos por uma vida mais picante?"


*


* Hugo é mexicano e restauranter do Obá, casa paulistana de fusionfood latinoamericana. ** a ilustração é propositalmente rosinha, suave e úmida, vinda diretamente do lado oposto do México no globo terrestre - um contraponto de equilíbrio para o retrogosto red hot chilli pepper que texto deixa na língua...

domingo, 17 de julho de 2011

Detesto sofrer



"Descobri que a saudade, quando atinge a carne, não é simples nostalgia, mas sim uma dor; da raiz dos cabelos até à planta dos pés, ela tece sobre a minha pele uma túnica envenenada."


Simone Beauvoir, in A força da idade, 1960


*
 
 

* simplesmente a.m.o esse flagrante de Simone nua, de costas no banheiro. Tão linda e sedutora e feminina e entregue à vaidade de se deixar fotografar... Vi-a [a foto] pela primeira vez em 2006, publicada na capa da Ilustrada, da Folha de S. Paulo. Mexeu comigo. Deve ter mexido com muita gente. Como entender Simone depois desta foto? A Simone ícone feminista, musa existencialista, autora de O Segundo Sexo (ainda a bíblia feminista, nestes tempos de negação de bíblias e feminismo?) bissexual e parceira de Sartre? A foto, sacada por Art Shay, fotógrafo norte-americano, em 1950. Íntimos, certamente. Simone estava com 44 anos [assim como eu, em 2011] e deslumbrante [não exatamente como eu, desde muito]. Já tinha escrito O Segundo Sexo. E naquele momento, apaixonada por outro americano, o jornalista e escritor Nelson Algren. Simone esteve envolvida com Algren por 20 anos. E com tantos outros, no mesmo período. E sempre ao lado de Sartre, até seu último suspiro. Gosto da foto porque me agrada pensar em Simone como uma mulher de verdade. Uma intelectual que pensava o corpo. Melhor: um corpo que fez sua cabeça dançar miudinho... E que suas escolhas foram as que possibilitaram este corpo que vejo - sem as marcas de uma vida de tensão, repressão ou sofrimento. . Dizem que Sartre era o libertário. Que Simone, por acompanhá-lo, aceitava. Hoje, percebo Simone infinitamente maior que Sartre. Uma vida que não se fartou de viver... **o título também foi escrito por Simone; vindo logo após a frase citada.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Declaração


...por isso vos digo
não deixeis o vosso grande amor
refém dos mal-entendidos do mundo.


José Tolentino Mendonça, in Longe não sabia


*


L'homme avec soul



  • Ben L’Oncle Soul é um jovem soulman com jeitão de muitas vidas vividas,
  • com o plus que o povo francês carrega: delicioso de ver e ouvir.
  • em seu primeiro disco, de 2010, não há uma música que não valha a pena.
  • como esta versão de Seven Nation Army, do White Stripes.


  • e como controlar a vontade de tirar um desses backing vocals do palco prá rodopiar no salão? 

*


domingo, 10 de julho de 2011

A busca da razão



Sofreu muito com a adolescência.
Jovem, ainda se queixava.
Depois, todos os dias, subia numa cadeira, agarrava uma argola presa ao teto e, pendurada, deixava-se ficar.
Até a tarde em que se desprendeu esborrachando-se no chão: estava madura.


Marina Colasanti, in Contos de Amor Rasgados, 1986 

*



* o problema todo de amadurecer é essa necessidade de deixar-se ficar na imobilidade da argola, tendo somente a parede como paisagem... *** imagem: João Daniel Pereira, do flickr.

Under



As águas calmas do ar
sob o murmúrio do eco.
As águas calmas da água
sob uma folha de estrelas.
As águas calmas da sua boca
sob um emaranhado de beijos.

 
Federico Garcia Lorca
(Variações, in Primeiras Canções, 1922)

*


sexta-feira, 8 de julho de 2011

Obsessão turquesa


"Para onde nos atrai o azul?" já nos perguntava Guimarães Rosa


"Pois, lhe digo minha Dona. É uma pena a senhora andar por aí fatigando seus olhos pelo mundo. Devia era, logo de manhã, passar um sonho pelo rosto. É isso que impede o tempo e atrasa a ruga. Sabe o que faz? Estende-se aí na areia, oblonga-se deitadinha, estica a alma na diagonal. Depois, fica assim, caladita, rentinha ao chão, até sentir a terra se enamorar de si. Digo-lhe, Dona: quando ficamos calados, igual uma pedra, acabamos por escutar os sotaques da terra. A senhora num certo momento, há-de ouvir um chão marinho, faz conta é um mar sob a pele do chão. Aproveita esse embalo, Dona Luarmina. Eu tiro boas vantagens desses silêncios submarinos. São eles que me fazem adormecer ainda hoje. Sou criança dele, do mar." Mia Couto  



*


* se os excessos cansam, aqui está: enjoei já deste inverno. Tão cedo, tanto ainda, mas ando a sonhar com o cheiro do sal, do mar e de como isso fica bom de lamber na pele. E como sonhar não custa nada, ando soltando uns suspiros para os lados da Croácia...

Vaidade e vento que passa


"Vaidade das vaidades, vaidade das vaidades! Tudo é vaidade. Que proveito tira o homem de todo o trabalho com que se afadiga debaixo do sol? Uma geração passa, outra vem; mas a terra sempre subsiste. O sol se levanta, o sol se põe; apressa-se a voltar a seu lugar; em seguida, se levanta de novo. O vento vai em direção ao sul, vai em direção ao norte, volteia e gira nos mesmos circuitos. Todos os rios se dirigem para o mar, e o mar não transborda. Em direção ao mar, para onde correm os rios, eles continuam a correr. Todas as coisas se afadigam, mais do que se pode dizer. A vista não se farta de ver, o ouvido nunca se sacia de ouvir. O que foi é o que será: o que acontece é o que há de acontecer. Não há nada de novo debaixo do sol. Se é encontrada alguma coisa da qual se diz: Veja, isto é novo, ela já existia nos tempos passados. Não há memória do que é antigo e nossos descendentes não deixarão memória junto daqueles que virão depois deles. Eu fui rei de Israel em Jerusalém. Apliquei meu espírito a um estudo atencioso e à sábia observação de tudo que se passa debaixo dos céus: Deus impôs aos homens esta ocupação ingrata. Vi tudo o que se faz debaixo do sol, e eis: tudo é vaidade, e vento que passa. O que está curvado não se pode endireitar, e o que falta não se pode calcular. Eu disse comigo mesmo: Eis que amontoei e acumulei mais sabedoria que todos os que me precederam em Jerusalém. Porque meu espírito estudou muito a sabedoria e a ciência, e apliquei o meu espírito ao discernimento da sabedoria, da loucura e da tolice. Mas cheguei à conclusão de que isso é também vento que passa. Porque no acúmulo de sabedoria, acumula-se tristeza e quanto mais aumenta a ciência, mais aumenta a dor."

Palavras do Eclesiastes [capítulo 1], filho de Davi, rei de Jerusalém


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O desejo é uma ilusão de eternidade



"A eternidade e o desejo são tão parecidos, que ambos se retratam com a mesma figura. Os egípcios nos seus hieroglifos - e antes deles os caldeus - para representar a eternidade pintaram um O: porque a figura circular não tem princípio, nem fim; e isto é ser eterno. O desejo ainda teve melhor pintor, que é a natureza. Todos os que desejam - se o afeto rompeu o silêncio e do coração passou à boca - o que pronunciam é O".



Inês Pedrosa, in A Eternidade e Desejo


*




* E o desejo não satisfeito, como fica? Um oooou fundo que parece um uivo... inda mais parecido com a eternidade.

Books, books, books... (2)






"...tinham-me feito descobrir uma riqueza inédita: a solidão rodeada de livros." Miguel Torga


‎"Quando penso em todos os livros que ainda me cabem ler, tenho certeza de que serei feliz." Jules Renard





"Onde eu não estou, as palavras me acham." Manoel de Barros




*





* é comum a todos os que me conhecem um pouco: minha imagem sempre está associada aos livros. Tenho sempre um, ao menos, ao meu lado: na bolsa, na fila do banco, no avião, ao lado do prato na mesa, durante a pausa para o café... preferia ser lembrada pela beleza, ou pela sabedoria; calharam-me os livros e a literatura - que são os dois juntos - e tudo o mais o que há na Terra... ** na última foto, uma imagem surpreendente da Segunda Guerra Mundial: soldado americano faz uma pausa para verificar os livros deixados para trás por uma família alemã. *** frase de Renard, enviada com uma dedicatória linda por minha irmã Marlu. Obrigada, querida!