sexta-feira, 29 de julho de 2011

O que o polvo Paul verdadeiramente disse


  • eles são conhecidos como holdouts
  • militares japoneses que, sem informações oficiais sobre o término da segunda guerra mundial, continuaram lutando e resistindo em seus postos em algumas ilhas do Pacífico
  • isolados e com comunicação precária (geralmente dependendo de algum bravo mensageiro voluntário ou bilhetes amarrados em vacas ou folhetos jogados por aviões)
  • os holdouts eram instruídos a: 1 - resistir a qualquer tentativa de ocupação, 2 - não se render e 3 - não se matar, sob qualquer circunstância
  • ou seja, não cediam nunca!
  • qualquer tentativa de contato era interpretada como armadilha ou, na melhor das hipóteses, propaganda do inimigo
...
  • o caso mais famoso é de Hiiro Onoda
  • Onoda ficou 30 anos isolado e mandando chumbo em quem se aproximasse
  • feriu 100. matou 30.
  • transformou-se em uma espécie de ermitão assassino, odiado pelos habitantes locais
  • não acreditou nem na voz de seu superior, reproduzida em carros de som
  • até a mãe dele foi até ele; gritou com um megafone (!), sem sucesso.
  • paranóia total.
...
  • mas a história fica ainda mais surpreendente.
  • em 1974, um estudante japonês chamado Nario Suzuki resolve sair com sua mochila mundo afora
  • na cabeça, três objetivos: "achar Onoda, um panda e o abominável Homem das Neves"
  • como só se vê em Hollywood, Suzuki vai até a ilha nas Filipinas, esquece as praias paradisíacas, entra pela mata e dá mesmo de cara com Onoda
  • grita 3 vezes "sou japonês, sou japonês, sou japonês" e ...
  • não é alvejado!
  • após quase 8 horas de explicações (onde imagino o soldado reaprendendo a conversar) o estudante conta-lhe tudo o que aconteceu
  • ainda assim, Onoda recusa-se a abandonar seu posto - "não sem a ordem de meu superior"
  • o estudante volta para o Japão e localiza o superior de Onoda,
  • um tal de Major Taniguchi, que à essa altura está aposentado e virou dono de livraria.
Taniguchi e Onoda

  • em 1975 (29 anos após o término da Segunda Grande Guerra Mundial),  Onoda finalmente se apresenta diante de seu superior, impecavelmente uniformizado
  • este é o trecho de sua autobiografia onde relata este momento:

"Nós realmente perdemos a guerra! Como fomos tão desleixados? De repente tudo ficou escuro. A tempestade rugia dentro de mim. Eu me senti como um idiota por ter estado tão tenso e cauteloso no caminho para cá. Pior do que isso, o que eu tinha feito durante todos esses anos? Gradualmente, a tempestade amainou e pela primeira vez eu realmente entendi: minha vida, os trinta anos como guerrilheiro para o exército japonês, tudo acabado. Este foi o fim. Puxei o ferrolho no meu rifle e descarreguei as balas... Baixei a sacola que sempre carregava comigo e depositei a arma em cima dela. Será que realmente não terei mais uso para este rifle que eu tinha polido e cuidado como a um bebê todos estes anos? E o rifle Kozuka, escondido por mim em uma fenda nas rochas? A guerra realmente acabou há 30 anos atrás? Se isso for verdade, não teria sido melhor se eu tivesse morrido?"
...
  • Onoda ainda teve que ser perdoado por seus crimes por Ferdinando Marcos, então presidente das Filipinas, para tornar-se um homem livre 
  • e foi só em 1979 que voltou ao lar
  • [pensou que este era o fim da história? então senta!]
  • Onoda deu uma guinada - hemisferial - em sua vida
  • infeliz com as modernidades do Japão saiu de mala e cuia para...
  • adivinhe?
  • o Brasil! foi parar no Mato Grosso do Sul
  • aqui criou gado; casou-se.
  • e mesmo com a vida tranquila no interior rico e fertil do país 
  • mais uma vez dá uma reviravolta em sua vida:
  • em 84 volta para o Japão e inaugura uma escola especial de técnicas de sobrevivência
  • seu objetivo? "aumentar a independência e autonomia dos jovens cidadãos japoneses".
  • Onoda ainda vive; em 2012 fará 90 anos
  • [o que significa que a história ainda pode aumentar; portanto, Sem Fim]
...
  • pena não ter conseguido descobrir se o estudante Suzuki encontrou um panda
  • [que Onoda é tão mais absurdo que o Abominável Homem das Neves que nem vale a busca]


*




* esta história incrível me faz lembrar de uma piada de humor negro e de uma entrevista que li, ano passado, em uma revista espanhola. O entrevistado, o jornalista que é o âncora do telejornal de maior ibope na Espanha [desculpe minha memória fajutinha, mas não gravei o nome], em um trecho conta o que ainda o fascina na profissão - "as histórias de vida, a própria vida, o fantástico em tudo. Veja a Copa de Futebol deste ano [2010]. Se alguém viesse me procurar há dois meses contando de um polvo inglês em um aquário alemão que prevê - com acerto! - os resultados finais dos jogos do futebol, eu não só duvidaria, mas desconfiaria que meu interlocutor estivesse em uma viagem de ácido". Então ficamos assim: sempre que você se sentir desacreditado da vida e tudo lhe parecer sem graça, lembre-se do polvo Paul. E de Hiiro Onoda! ** mais um post gentilmente patrocinado pelo Wagner Brenner, do update or die. ***  a piada, de tão incorreta, conto só sob tortura!

3 comentários:

  1. Realmente os horrores que a guerra deixa no mundo são de proporções inimagináveis. Passei pela Alemanha e visitei locais que até hoje causam arrepios, porém mesmo lá, não vi, li, ou ouvi nada parecido com o Onoda. Ele colocou o homen das neves no bolso, urso Panda então, passou a ser bicho de estimação de tão fácil ser achado.

    ResponderExcluir
  2. mas me conta, André, na Alemanha não comeste polvo, né?

    ResponderExcluir
  3. Não não, nem pensar ;)

    ResponderExcluir